A SOMBRA

Hoje acordei com uma intensidade enorme me dominando. Acordei sentindo que meus sentimentos estavam abalados. Eles me cutucaram e pediram para que eu não me comovesse com os acontecimentos.

            Apesar de todas as intenções me perseguirem, eu apenas olhei-as de soslaio sem que nada e ninguém interferissem no meu instante.

Permaneci imóvel por um longo período. Solitária, avaliei cada pessoa que atravessou no meu caminho. Cada movimento. Cada peça invisível que tentou se mover.

Olhei para trás e nada apareceu. Apenas minha sombra que sorria para mim. Sorri para ela e caminhamos juntas, por um longo e íngreme caminho, em silêncio.

Lado a lado como duas estátuas, frias e caladas, fomos cabisbaixas em direção do nada. O caminho não se movia, aceitava sem reclamar que pisássemos nele sem ao menos termos limpado os sapatos.

O toc toc dos nossos passos acordaram os que dormiam no colo do mundo. Ficaram revoltados ao serem acordados dos seus sonos amenos. Vi quando seus olhos se abriram e suas pupilas cravaram dentro da minha como se estivessem entrando e se apossando de mim.

Continuei caminhando e a sombra ao meu lado calada. O medo me acompanhou uns longos quilômetros, como os dias que passam pelas horas sem dizer uma única palavra. Meus pés doíam e senti o cansaço se apossar de mim. Olhei para a sombra e disse:

- Não te cansas de me acompanhar?

- Não. Respondeu a sombra. Apesar de ver o cansaço se apossando de ti, dentro do teu intimo há luz e esperança. Minha felicidade é estar ao teu lado. Caminhando ao teu lado, terei companhia para os meus dias de solidão, disse a sombra.

Pensou alguns minutos e disse:

- Tu me ouves sem questionamentos. Difícil hoje em dia encontrar alguém disposto a ouvir.

Percebi então que até a sombra tinha seus dias de solidão e tristeza.

Olhei-a e vi que apesar de ser uma sombra, tinha sentimentos. Apenas se escondia atrás daquela roupagem preta.

Rita Padoin